Circo – o maior espectáculo do mundo
Foi com Somos todos um bocado ciganos que entrei no mundo literário de Manuel Jorge Marmelo. E não parei de o percorrer, sendo sempre com gosto que pego num dos seus livros. Um escritor cheio de recursos narrativos, bem espelhados ao longo do seu percurso literário. Umas vezes mais sério, outras bem jocoso e pelo meio passando por narrativas onde algum delírio de sentido leva o leitor a um estado mais onírico, tal como alguns personagens do seu texto.
Através de situações insólitas, Marmelo vai passando, em Somos todos um bocado ciganos, por temas muito complexos como a exclusão social e a marginalidade. Com um circo decadente como pano de fundo, podemos tirar um conjunto de interpretações, desde a mais óbvia alusão à actividade circense clássica actual no nosso país, nómada e precária, onde as dificuldades subjacentes se vão contrapondo ao Grande e Maravilhoso Espectáculo, até à percepção de que todos os valores sociais se conjugam, de uma forma mais ou menos periclitante, dentro daquela pequena comunidade, com uma mistura cultural, racial e religiosa, onde podemos encontrar uma micro-representação do país.
A incerteza é vivida duma forma muito intensa ao longo da narrativa, onde se misturam cenários caóticos com situações divertidas e onde o humor e a ironia caminham de mãos dadas.
Um livro que vale a pena, de um autor que tem crescido e que, na minha opinião, já ganhou um lugar importante na literatura portuguesa contemporânea. Por isso mesmo mais cedo ou mais tarde voltaremos a ele.
Esta conjugação de culturas e estilos, encontramo-la para além deste circo decrépito, numa fusão muitas vezes única e deliciosa. Foi o que aconteceu quando Michel Camilo, pianista e compositor, se juntou a Tomatito, um guitarrista de flamengo espanhol. Ao longo destes anos surgiram 3 albuns a reter, Spain (em 2000), Spain Again (em 2006) e Spain Forever (em 2016). Um dueto improvável a não perder.