A obra de Eça de Queirós, na sua visão crítica duma sociedade sempre actual, que se repete a cada década, não se esvaziando de forma ou conteúdo e que cada época a preenche na sua plenitude mantendo um status quoinalterado, traduz a imutabilidade social e política de várias gerações que se vão sucedendo aparentemente num registo de mudança que se percebe apenas superficial.
De toda a sua obra, que com muito agrado fui lendo, nos muitos anos da minha juventude, e que agora me vão ficando serenas lembranças e sólidas recordações de críticas mordazes e histórias profundas, não posso deixar de realçar, por motivos diversos, A relíquia, o Alves e Companhia e Os Maias.
Se bem que tendo que escolher, a minha opção pendesse em A relíquia, onde Teodorico Raposo e D. Maria do Patrocínio protagonizam o mais brilhante dos romances de Eça, é a propósito de Os Maiasque vou gastar as próximas linhas.
De leitura obrigatória no Ensino Secundário, passou neste ano lectivo a obra opcional, podendo os Srs. Professores optarem, penso não estar errado, por outra obra do Autor, que pensem melhor se adequar à classe em questão. Como cumprem agora 130 anos de existência Os Maias(e Eça) são alvo da atenção da Fundação Calouste Gulbenkian, com honras de capa na Visão, o que felicito, cabendo a várias personalidades comentarem, num punhado de páginas, sob a pena de Sílvia Souto Cunha, a mestria do autor.
Em páginas separadas coube a Afonso Reis Cabral escrever uma Carta ao aluno que não lê “Os Maias”. Se quando ganhou o Prémio Leya achei que a melhor forma que teve de o publicitar foi dizer que não ganhou por ser trineto de Eça, e não pelo livro em si, aqui já concordo em absoluto com o que escreve o Trineto. Quem fica a perder é quem não leu Os Maias. A descrição do Ramalhete não é uma seca, é uma descrição primorosa que só por si deveria ser escalpelizada obrigatoriamente nas aulas de português. E ao longo das três gerações da família, Eça vai mostrando uma sociedade que perdura para além do século XIX e que, em pleno século XXI, com roupagem moderna, está instalada e para ficar. Na sua linguagem intemporal Os Maiaspodiam ser qualquer família do centro de Lisboa, mas também do Porto ou de Coimbra, ou mesmo de Ponte de Lima, Viseu, Guarda ou Setúbal .
Já lá vão muitos anos desde que li Os Maias. Não me lembro se Carlos da Maia e Maria Eduarda apreciavam música. Apesar da escrita realista, fugida do período romântico, espelhando uma nova forma de modernidade descritiva, eu consideraria para acompanhamento o Concerto para Violino e Orquestra de Max Bruch, um compositor alemão do período romântico.