Seguir uma linha de escrita ou adaptar a escrita a circunstâncias diferentes são duas formas de estar na literatura. Usar uma fórmula ou usar a criatividade e a capacidade expressiva.
Algum tipo de literatura adapta-se bem à fórmula. É o caso de Dan Brown. Li O código Da Vinci num ápice. Achei-o fantástico. Uma história muito bem conseguida, que desperta o interesse a cada página que passa e as surpresas subsequentes são sempre mais interessantes que as anteriores. Além disso a explicação histórica (no caso pseudo-histórica) das situações é sublime. Dan Brown consegui criar uma história de suspense baseada numa descrição histórica coerente, bem desenhada mas absolutamente desalicerçada de rigor histórico. Li o livro antes da maioria dos portugueses e antes de instalada qualquer polémica. Digo isto não por júbilo ou chico-espertice, mas apenas para introduzir o porquê de ter lido O código da Vinci. Fiz um período de férias no México, local muito apreciado por turistas americanos. No hotel em que fiquei, bem como nos hotéis circundantes e por todo lado onde passei, não havia vivalma que não estivesse a ler The Da Vinci Code. Este hegemonia despertou-me o interesse. Habitualmente cada cabeça sua sentença. Habitualmente cada um lê um livro diferente dos outros. Por coincidência haverão duas pessoas a ler o mesmo livro. Toda a gente com o mesmo livro não é habitual. A primeira coisa que fiz quando cheguei de férias foi procurar o livro. “Ainda não foi editado em Português”, ouvi em várias livrarias. Esperei 1 a 2 meses. Foi editado! Comprei e li. Fantástico. Adorei. Guardei o livro na estante. Cerca de um mês depois estoura a polémica. Não vou falar dela. Foi há uns anos, a maior parte das pessoas certamente se lembra ainda dela. Melhor publicidade para o livro não podia ter havido.
Como sabem, escrevo estes textos, como se costuma dizer, (embora não se aplique ao computador), ao correr da pena. Isto para dizer que quando comecei a escrever e escolhi este título, o meu objectivo era falar em Valter Hugo Mãe e na sua capacidade de adaptar a escrita, a narrativa e a história a um local específico, sendo que essa história não poderia passar-se noutro lado. Quando lemos Homens imprudentemente poéticos lemos o Japão, lemos a sociedade japonesa, lemos os costumes japoneses, lemos Japão em todo o seu esplendor, em toda a sua história, no peso das suas tradições. É impossível termos esta história noutro local. E o mesmo se passa quando lemos Desumanização. Não podemos por esta história no Japão. Não podemos por esta história na Suíça, na Bélgica, no Canadá ou no Bangladesh. É uma história Islandesa. E ao avaliarmos a expressão narrativa encontramos características completamente diferentes nos dois textos. Características essas que estão embriologicamente ligadas aos locais. Deixamos de ter a fórmula “mágica” de Dan Brown. Passamos a ter a classe, a mestria e a criatividade de um dos melhores autores portugueses contemporâneos.